No cenário educacional atual tem sido cada vez mais desafiador apresentar aos estudantes como as tecnologias digitais podem fazer parte da nossa vida de uma forma significativa e que possa nos ajudar a entender os elementos positivos do território digital. Não é tarefa das mais simples estimular a reflexão de que existe conteúdo além da publicidade e dos famosos virais.
Nesse contexto criei um jogo simples, inspirado no formato Escape Room, com poucos desafios e telas chamado de “Barraca do Conhecimento“. A ideia foi apresentar um ponto de partida para ajudar professores e professoras a ressignificar o aprendizado sobre conteúdos específicos como a cultura popular brasileira e nesse caso específico sobre as festas juninas.
Quando desenvolvi o recurso em 2022 na plataforma Genially, a ideia dessa experiência gamificada em formato de Escape Room me pareceu ser mais do que uma simples ferramenta lúdica, passou a ser também uma proposta pedagógica alinhada com teorias da aprendizagem que costumam orientar as minhas criações como o construcionismo de Papert e princípios da gamificação educacional defendidos por McGonigal, como sistemas de feedback imediato e o estímulo a participação ativa e voluntária nas atividades propostas pelo professor.
A estrutura de gamificação que planejei incluiu objetivos claros de conquistar emblemas como Chapéu de Palha, Milho Verde e Sanfona para se tornar “PhD em tradições juninas”. Quando pensei nesses níveis, lembrei de Vygotsky que falou sobre a importância do estabelecimento de metas desafiadoras, porém alcançáveis. A linguagem lúdica, com expressões como “Salta essa fogueira!” e “Puxa esse fole!”, eu escolhi com base no meu próprio repertório para criar um ambiente de aprendizagem descontraído. Na época, vivíamos a pandemia de Covid-19 e eu estava empenhada em criar algo para as festas juninas. Em paralelo estava relendo textos e pesquisas de Csikszentmihalyi sobre flow (estado de fluxo) e buscando gerar minimamente um estado de fluxo no percurso do meu jogo. Obrigada ao ProfLab: formações criativas, especificamente a Giordano Cabral e Felipe de Brito Lima, pelo conhecimento e referências compartilhadas.
O design inicial de um jogo para celular foi ganhando status de experiência de aprendizagem com abordagem ativa. Através de charadas, estrofes de cordel, identificação de músicas e artistas, além de perguntas sobre história e costumes, o game tinha o objetivo de ajudar os estudantes a desenvolver habilidades como raciocínio lógico, interpretação textual e contextualização cultural, competências essenciais na perspectiva da educação.
Queria um sistema de feedback imediato, mas não qualquer um. Por isso pensei em respostas como “VIXE!!! Queimou o dedo!” para erros e “ARRETADO!!! Mandou bem na rima!” para acertos. Ambas as opções ajudam a reforçar positivamente os acertos e oferecem oportunidades imediatas de correção para os equívocos. Essa característica é particularmente valiosa quando consideramos os estudos sobre a importância do feedback no processo de aprendizagem.
A abordagem interdisciplinar do jogo, integrando conteúdos de música, literatura, história, geografia e artes, foi inspirada nas práticas educacionais propostas por Jose Moran com sua teoria sobre educação transformadora e integração curricular. Ao conectar saberes diversos em torno do eixo temático das festas juninas, entendo que o jogo permite que os alunos percebam as relações entre diferentes áreas do conhecimento, desenvolvendo uma compreensão mais holística da cultura popular brasileira, fundamental na formação cidadã defendida nos Parâmetros Curriculares Nacionais.
Como levar o recurso para a sala de aula
Até aqui falei sobre o processo criativo do recurso digital. Mas, o que fazer para que ele possa funcionar em sala de aula? A “Barraca do Conhecimento” pode oferecer possibilidades adaptáveis a diferentes níveis de ensino.

Nos anos iniciais do Fundamental, pode servir como ponto de partida para atividades de produção textual e expressão artística. Nos anos finais, transforma-se em ferramenta para análise literária do cordel e discussões históricas sobre a origem da quadrilha. No Ensino Médio, assume potencial como estudo de caso para reflexões sociológicas sobre ressignificação cultural e como modelo para produção de conteúdos digitais pelos próprios alunos.
Embora o jogo apresente todas essas características, para funcionar ele depende da mediação docente. A simples inclusão de tecnologias na educação não garante nem a melhoria, nem a própria aprendizagem. Sempre é necessário um planejamento pedagógico que considere as particularidades de cada turma. Nesse sentido, sugiro que o professor considere potencializar a experiência promovendo trabalhos em grupo, inserindo momentos de reflexão e adaptando o ritmo às necessidades específicas dos seus estudantes.
A depender do olhar do professor, o jogo pode ser o elemento motivador de um projeto interdisciplinar mais amplo sobre cultura popular, culminando na organização de uma feira cultural ou algo semelhante que envolva toda a comunidade escolar.
Em tempos em que a cultura popular compete com influências culturais padronizadas, recursos como “Barraca do Conhecimento” podem apresentar uma dupla importância: enquanto recurso educacional inovador e como instrumento de valorização do patrimônio cultural brasileiro. Ao aliar tecnologia, gamificação e conteúdos tradicionais, esse tipo de projeto pode demonstrar como os recursos digitais podem ser poderosos aliados na preservação e ressignificação das tradições populares na era digital.
Foi por essas razões que criei e continuo divulgando a “Barraca do Conhecimento” até hoje. Você consegue acessar o jogo no link: https://bit.ly/barracadoconhecimento. E sabe o que é melhor? Você consegue compartilhar o recurso em sua turma no Google Sala de Aula através do botão de compartilhamento disponível no Genially.
Também é possível desenvolver um recurso semelhante no Apresentações Google usando funções como links e navegação entre os slides, inserção de áudio e animações de entrada e saída de elementos. O novíssimo Google Vids também é um aplicativo com funções de animação de elementos em que você pode desenvolver projetos semelhantes.
Agora é com você! Que tal se inspirar na proposta e criar um projeto sobre a cultura popular da sua região.
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